domingo, 21 de janeiro de 2018

Geometria


Aghata sempre fora um animal inquieto desde o seu nascimento. 
Exceto pelos meses que passara na barriga de sua mãe, ela diria que todos os lugares por onde viveu e morou lhe pareceram incômodos e desconfortáveis.


Fora sempre uma estrangeira aonde quer que fosse. De nada adiantava a água, a comida, uma paisagem bonita, um cantinho fresco para repousar o corpo.
Assim, quando saia dos seus confinamentos, Aghata corria em círculos, desesperada, procurando uma forma de voltar para o que ela considerava sua casa, que na verdade, não atinava onde pudesse ser.

Foram incontáveis as ocasiões de fugas e de falsa liberdade durante toda sua juventude e idade adulta.
Os seus donos, preocupados, começaram a segui-la para tangê-la,- se não de volta pra casa, já que ela não sabia onde ficava -, mas para mantê-la quieta e não lhes trazer aborrecimentos.
A princípio ela resistia e escapava dos perseguidores em louca disparada, dando voltas e voltas, sem contudo,  ir a lugar algum.

Aos poucos foi ficando velha e resignada.

Ainda se movimenta lentamente no interior do círculo, onde em várias extremidades, se posicionam seus caçadores, cada um num local estratégico, a vigiá-la ao longe, por toda a circunferência.


Aghata agora caminha titubeante, percorre o raio que vai do centro do círculo ao ponto onde se acha um dos seus donos.
Lá é escorraçada e ela faz o caminho inverso. Faz vários percursos, sempre enxotada por um empurrão, uma pedrada, uma palavra àspera  e ela retorna ao ponto zero.


Tantos diâmetros percorridos. Mas Aghata sabe que não há saída.
Deita-se, aconchega-se consigo mesma.
Tenta não sentir dor. Não sentir dor já lhe dá um pouco de paz.

Pensa numa estrela distante e se acalma.
Assim deverá viver até tornar-se apenas um punhado de pó a pairar no espaço.


Aghata não não sente mais desejo de voltar pra casa. E isso não tem mais importância.


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